Estimados irmãos e irmãs! Depois de ter celebrado a Solenidade de Todos os Santos, hoje a Igreja convida-nos a comemorar todos os fiéis defuntos, a dirigir o nosso olhar para os numerosos rostos que nos precederam e que concluíram o caminho terreno.
Na audiência deste dia, então, gostaria de vos propor alguns pensamentos simples sobre a realidade da morte, que para nós cristãos é iluminada pela Ressurreição de Cristo, e para renovar a nossa fé na vida eterna.
Visita aos cemitérios, esperança de eternidade
Como disse ontem no Ângelus, nestes dias vamos ao cemitério para rezar pelas pessoas queridas que nos deixaram; é quase como ir visitá-los para lhes manifestar, mais uma vez, o nosso carinho, para os sentir ainda próximos, recordando também, deste modo, um artigo do Credo: na comunhão dos Santos há um vínculo estreito entre nós que ainda caminhamos nesta terra e muitos irmãos e irmãs que já alcançaram a eternidade.
Desde sempre, o homem preocupou-se pelos seus mortos e procurou conferir-lhes uma espécie de segunda vida, através da atenção, do cuidado e do carinho. De certa maneira, deseja-se conservar a sua experiência de vida; e, paradoxalmente, como eles viveram, o que amaram, o que temeram, o que esperaram e o que detestaram, nós descobrimo-lo precisamente a partir dos túmulos, diante dos quais se apinham recordações. Esses são como que um espelho do seu mundo.
Por que é assim? Porque, não obstante a morte seja com frequência um tema quase proibido na nossa sociedade, e haja a tentativa contínua de eliminar da nossa mente até o pensamento da morte, ela diz respeito a cada um de nós, refere-se ao homem de todos os tempos e de todos os espaços. E diante deste mistério todos, também inconscientemente, procuramos algo que nos convide a esperar, um sinal que nos dê consolação, que abra algum horizonte, que ofereça ainda um futuro.
Na realidade, o caminho da morte é uma senda da esperança, e percorrer os nossos cemitérios, como também ler as inscrições sobre os túmulos, é realizar um caminho marcado pela esperança de eternidade.
Temor diante do mistério da morte e do juízo
Mas perguntamo-nos: por que sentimos medo diante da morte? Por que motivo uma boa parte da humanidade nunca se resignou a acreditar que para além dela não existe simplesmente o nada?
Diria que as respostas são múltiplas: temos medo diante da morte, porque temos medo do nada, este partir rumo a algo que não conhecemos, que nos é desconhecido. E então em nós existe um sentido de rejeição, porque não podemos aceitar que tudo quanto de belo e grande foi realizado durante uma existência inteira seja repentinamente eliminado e precipite-se no abismo do nada. Sobretudo, nós sentimos que o amor evoca e exige eternidade, e não é possível aceitar que ele seja destruído pela morte num só instante.
Além disso, temos medo diante da morte porque, quando nos encontramos próximos do fim da existência, há a percepção de que existe um juízo sobre as nossas obras, sobre o modo como conduzimos a nossa vida, principalmente sobre aqueles pontos de sombra que, com habilidade, muitas vezes sabemos anular ou tentamos remover da nossa consciência.
Diria que precisamente a questão do juízo está com frequência subjacente ao cuidado do homem de todos os tempos pelos finados, à atenção pelas pessoas que foram significativas para ele e que não estão mais ao seu lado no caminho da vida terrena. Num certo sentido, os gestos de carinho e de amor que circundam o defunto constituem um modo de o proteger, na convicção de que eles não permanecem sem efeito na hora do juízo. Podemos ver isto na maior parte das culturas que caracterizam a História do homem.
A alma humana requer eternidade
Hoje o mundo tornou-se, pelo menos aparentemente, muito mais racional, ou melhor, difundiu-se a tendência a pensar que cada realidade deve ser enfrentada com os critérios da ciência experimental, e que também à grandiosa interrogação da morte é necessário responder não tanto com a fé, mas a partir de conhecimentos experimentais, empíricos.
Porém, não nos damos conta de modo suficiente de que precisamente desta maneira terminamos por cair em formas de espiritismo, na tentativa de manter algum contato com o mundo para além da morte, quase imaginando que existe uma realidade que, no final, seria uma réplica da vida presente.
Caros amigos, a Solenidade de Todos os Santos e a Comemoração de Todos os Fiéis Defuntos dizem-nos que somente quem pode reconhecer uma grande esperança na morte, pode também levar uma vida a partir da esperança. Se nós reduzirmos o homem exclusivamente à sua dimensão horizontal, àquilo que se pode sentir de forma empírica, a própria vida perde o seu profundo sentido.
O homem tem necessidade de eternidade, e para ele qualquer outra esperança é demasiado breve, é demasiado limitada. O homem só é explicável se existir um Amor que supere todo o isolamento, também o da morte, numa totalidade que transcenda até o espaço e o tempo. O homem só é explicável, só encontra o seu sentido mais profundo, se Deus existir. […]
Crer na vida eterna
Deus revelou-Se verdadeiramente, tornou-Se acessível e amou de tal modo o mundo “que lhe deu seu Filho único, para que todo o que n’Ele crer não pereça, mas tenha a vida eterna” (Jo 3, 16), e no supremo gesto de amor da Cruz, mergulhando no abismo da morte, venceu-a, ressuscitou e abriu também para nós as portas da eternidade.
Cristo sustém-nos através da noite da morte que Ele mesmo atravessou; é o Bom Pastor, a cuja guia podemos confiar-nos sem qualquer temor, porque Ele conhece bem o caminho, até através da obscuridade.
Cada domingo, recitando o Credo, nós reafirmamos esta verdade. E visitando os cemitérios para rezar com afeto e com amor pelos nossos defuntos, somos convidados, mais uma vez, a renovar com coragem e com força a nossa fé na vida eterna; aliás, a viver com esta grande esperança e testemunhá-la ao mundo: por detrás do presente não existe o nada.
E é precisamente a fé na vida eterna que confere ao cristão a coragem de amar ainda mais intensamente esta nossa terra e de trabalhar para lhe construir um futuro, para lhe dar uma esperança verdadeira e segura. ◊
Excertos de: BENTO XVI.
Audiência geral, 2/11/2011