Para comemorar as núpcias da Segunda Pessoa da Santíssima Trindade com a natureza humana, um convite é feito a todas as gerações ao longo da História. Como ele se manifesta em nossos dias?

 

Evangelho do XXVIII Domingo do Tempo Comum

“Naquele tempo, Jesus voltou a falar em parábolas aos sumos sacerdotes e aos anciãos do povo, dizendo: ‘O Reino dos Céus é como a história do rei que preparou a festa de casamento do seu filho. E mandou os seus empregados chamar os convidados para a festa, mas estes não quiseram vir.

O rei mandou outros empregados, dizendo: ‘Dizei aos convidados: já preparei o banquete, os bois e os animais cevados já foram abatidos e tudo está pronto. Vinde para a festa!’. Mas os convidados o desprezaram: um foi para o seu campo, outro para os seus negócios, outros agarraram os empregados, bateram neles e os mataram.

O rei ficou indignado e mandou suas tropas, para matar aqueles assassinos e incendiar a cidade deles. Em seguida, o rei disse aos empregados: ‘A festa de casamento está pronta, mas os convidados não foram dignos dela. Portanto, ide às encruzilhadas dos caminhos e convidai para a festa todos os que encontrardes’. 10 Então os empregados saíram pelos caminhos e reuniram todos os que encontraram, maus e bons. E a sala da festa ficou cheia de convidados.

11 Quando o rei entrou para ver os convidados observou ali um homem que não estava usando traje de festa 12 e perguntou-lhe: ‘Amigo, como entraste aqui sem o traje de festa?’. Mas o homem nada respondeu. 13 Então o rei disse aos que serviam: ‘Amarrai os pés e as mãos desse homem e jogai-o fora, na escuridão! Ali haverá choro e ranger de dentes’. 14 Porque muitos são chamados, e poucos são escolhidos’” (Mt 22, 1-14).

I – A proximidade do Reino de Deus

Com divina singeleza narram os Evangelhos acontecimentos de incomparável transcendência, como a encarnação do Verbo, os incontáveis e estupendos milagres de Jesus, suas admiráveis pregações até sua dolorosa Paixão e Morte, seguidas da Ressurreição e Ascensão aos Céus.

Perante tais manifestações do sobrenatural, muitos eram os que compreendiam estar vivendo dias excepcionais. A geração que teve a ventura de conviver com o Divino Mestre e testemunhar fatos tão extraordinários, estava à espera de presenciar ainda algo de absolutamente incomum. A morte de Jesus não poderia representar o fim de tudo o que se passara então.

As grandes conversões após a descida do Espírito Santo, as pregações dos Apóstolos, os milagres operados por São Pedro invocando o nome de Jesus, alimentavam ainda mais essa expectativa. A Igreja nascente vivia assim num clima de proximidade da parusia, a ponto de São Paulo precisar corrigir o desvio dos tessalonicenses, que demonstravam uma culpável indiferença diante dos deveres da hora presente, sob pretexto de ser inútil seu cumprimento (cf. II Tes 2).

Passaram-se dois mil anos e a segunda vinda de Cristo, considerada iminente pelos primeiros cristãos, ainda não se realizou. Porém, essa viva esperança alentou-lhes a fé e o fervor, contribuindo para a sua perseverança nas árduas condições enfrentadas pela primitiva Igreja.

Embora não possa ser entendida num sentido meramente cronológico, a admoestação do Divino Mestre: “Fazei penitência, pois o Reino dos Céus está próximo” (Mt 4,17) e o consequente convite à conversão compõem o conteúdo central do Evangelho, conforme afirma o Papa Bento XVI: “O centro deste anúncio é a mensagem da proximidade do Reino de Deus. Este anúncio forma realmente o centro da palavra e do ministério de Jesus”.1

“Cristo discute com os fariseus” – Catedral de Saint-Gatien, Tours (França)

II – O banquete de casamento e o traje de festa

“Naquele tempo, 1  Jesus voltou a falar em parábolas aos sumos sacerdotes e aos anciãos do povo, 2a dizendo…”.

A passagem de São Mateus proclamada neste domingo começa por frisar que Jesus voltou a falar “em parábolas”.

Parábola é um termo de origem grega (?a?aß???) que etimologicamente significa “pôr ao lado”. Ele indica um gênero literário no qual se põe ao lado da verdade uma imagem que a torna mais viva e perceptível. Ora, a esse recurso as parábolas bíblicas acrescentam um segundo elemento: a expressão enigmática do pensamento. Elas são “um véu que oculta a profundidade do mistério àqueles que não podem, ou não querem, penetrar nele inteiramente”.2

Cristo serviu-Se muitas vezes desse meio em seu ministério público. A doutrina da Boa Nova era muito exigente e cobrava a perfeição moral do homem. Como opunha-se com frequência aos princípios vigentes, muitas vezes incompletos ou deformados, caso Nosso Senhor a ensinasse usando linguagem direta, sem as almas estarem preparadas para ouvi-la, poderia provocar uma rejeição completa logo de início, prejudicando gravemente o êxito de sua pregação. Por isso, a propósito de fatos comuns, compreensíveis a todos, Ele sugeria reflexões e punha problemas de consciência por meio de analogias, convidando as pessoas de forma muito suave e pedagógica à mudança de mentalidade e de vida.

Nesta ocasião, o Divino Mestre dirige-Se aos sumos sacerdotes e anciãos do povo que, tendo ouvido a parábola dos vinhateiros assassinos, imediatamente anterior a esta, compreenderam ser deles que Jesus falava e, tomados de ódio, procuravam prendê-Lo (cf. Mt 21, 45-46).

Deus convida o gênero humano para a visão beatífica

2b “O Reino dos Céus é como a história do rei que preparou a festa de casamento do seu filho”.

A exegese tradicional sempre interpretou a figura do rei como sendo o próprio Deus Pai, o qual comemora com um banquete a união do Filho com a humanidade, na pessoa de Cristo. Como bem sintetiza São Gregório Magno, “Deus Pai realizou as núpcias de Deus, seu Filho, quando O uniu à natureza humana no seio da Virgem, quando quis que Aquele que na eternidade era Deus, Se fizesse homem no tempo”.3

Dessas núpcias nasceu o povo eleito da Nova Aliança. Por elas, todo o gênero humano é convidado para a visão beatífica na vida futura, mistério de comunhão bem-aventurada com Deus que supera toda compreensão e toda imaginação.

3  “E mandou os seus empregados chamar os convidados para a festa, mas estes não quiseram vir”.

Para tão requintado banquete espiritual, Deus Pai manda convidar em primeiro lugar o povo eleito do Antigo Testamento, que deveria ter sua continuação no povo de Deus reunido no seio da Igreja Católica, plenitude da Sinagoga.

É interessante o comentário de Fillion sobre quem eram os “empregados” enviados pelo rei. Segundo o exegeta francês, esse convite foi feito “de acordo com o costume dos povos orientais que, independentemente do primeiro convite, não deixam de prevenir mais uma vez os convidados, pouco tempo antes do banquete. É assim que Deus, após ter convidado os judeus, pelos Profetas, a se prepararem para o Reino Messiânico, recordou-lhes por meio do Precursor, depois pelo próprio Jesus Cristo e por seus discípulos, que estava próximo o momento de ingressar na sala do festim”.4

Convém notar por fim, neste versículo, o fato de ter sido o rei quem mandou chamar os convidados, o que confere ao convite a força de uma ordem. Tendo naqueles tempos o soberano um poder absoluto sobre os seus súditos, uma convocação dessa natureza, além de muito honrosa, importava na obrigação de comparecer.

“Martírio de Santo Estêvão” – Catedral de Dijon (França)

Recusa altiva e criminosa dos convidados

4  “O rei mandou outros empregados, dizendo: ‘Dizei aos convidados: já preparei o banquete, os bois e os animais cevados já foram abatidos e tudo está pronto. Vinde para a festa!’. 5  Mas os convidados o desprezaram: um foi para o seu campo, outro para os seus negócios”.

Perante a primeira negativa, o rei não se irrita, mas insiste paternalmente, enviando outros empregados, ou seja, aqueles que já haviam aderido à pregação do Salvador a ponto de se porem a serviço d’Ele e propagarem a Boa Nova. Encontramos de novo aqui a imagem de Deus Pai, respondendo às recusas dos convidados com maiores demonstrações de amor.

Estes, porém, em lugar de se deixarem atrair pela bondade do rei, “o desprezaram”. De maneira indigna, altiva e grosseira, rejeitaram o convite formulado com tanta cortesia para um banquete regiamente preparado. Movidos pelo egoísmo, foram cuidar dos seus interesses pessoais. “Preferiram viver despreocupados do Reino Messiânico, uns entregues a seus prazeres, e os outros, absorvidos pelos negócios terrenos”.5

O campo e os negócios representam aqui as preocupações da vida concreta que tantas vezes concentram a atenção do homem e o escravizam. Porque, como ensina Santo Agostinho, há apenas dois amores: o amor de Deus levado até o esquecimento de si mesmo; ou o amor de si levado até o esquecimento de Deus.6 Não existe uma terceira opção.

6  “…outros agarraram os empregados, bateram neles e os mataram”.

A ingratidão de alguns chegou ao extremo de matarem os emissários do rei.

Eram estes Santo Estêvão, São Tiago o Maior, São Tiago o Menor e todas as outras vítimas das terríveis perseguições narradas nos Atos dos Apóstolos e nas Epístolas de São Paulo. Mas também incluem-se aqui os mártires de todos os tempos, ou seja, tantas outras testemunhas da Fé que serão perseguidas e mortas ao longo dos séculos por aqueles que não quiserem aceitar a pregação da Boa Nova.

O ódio gratuito desses convidados não visava só, nem principalmente, as pessoas dos emissários, mas sim o rei, que estes representavam.

Indignação divina perante a ingratidão

“O rei ficou indignado e mandou suas tropas, para matar aqueles assassinos e incendiar a cidade deles”.

Para bem entender esta frase, é indispensável ter em vista que naquele tempo os reis tinham direito de vida e de morte sobre seus súditos. Esta atitude, portanto, era considerada normal pelos ouvintes de Jesus.

Com este esclarecimento, fica evidente o significado do versículo: a indignação do rei é imagem da reação de Deus ao ver como os homens se obstinam em rejeitar os maternais convites da graça, ao longo da História.

Um segundo convite, estendido a todos

8  “Em seguida, o rei disse aos empregados: ‘A festa de casamento está pronta, mas os convidados não foram dignos dela’”.

“A festa de casamento está pronta”. Explica São Remígio: “Isto é, já está ultimado e concluído todo o sacramento acerca da redenção dos homens”, mas os convidados, “desconhecendo a justiça de Deus e querendo dar preferência à sua, se consideraram como indignos da vida eterna”.7 E assim, comenta o padre Antonio Orbe, SJ, “Israel, antigo povo eleito de Deus, cede lugar à nova linhagem, adquirida por Cristo, com seu Sangue”.8

“Pregação de São Pedro” – Catedral de Manresa (Espanha)

9  “‘Portanto, ide às encruzilhadas dos caminhos e convidai para a festa todos os que encontrardes’. 10  Então os empregados saíram pelos caminhos e reuniram todos os que encontraram, maus e bons. E a sala da festa ficou cheia de convidados”.

A todos o Criador chama de variadas formas, segundo os seus misteriosos desígnios. Depois de Se dirigir ao Povo Eleito por meio dos patriarcas e profetas, Deus envia seu próprio Filho para manifestar-Se a todos os homens, e Este, num auge de amor, morre na Cruz pelos pecadores. Assim, à Antiga Lei sucede a Santa Igreja Católica Apostólica Romana, Mãe e Mestra da Verdade, para conduzir a humanidade ao supremo banquete na eternidade.

“Ide, pois, e ensinai a todas as nações; batizai-as em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Ensinai-as a observar tudo o que vos prescrevi” (Mt 28, 19-20). Cumprindo esse mandado, foi a Igreja ao longo dos séculos convidando sucessivamente para o divino banquete todos os povos, bons e maus — ou seja, “aqueles que no paganismo levavam uma vida honesta, seguindo os ditames da Lei Natural, e os que viviam entregues às suas paixões”9 —, dando-lhes oportunidade de conhecer a verdade e aderir a ela. É a maravilhosa história da expansão da Santa Igreja pelo mundo.

O traje de festa representa o estado de graça

11  “Quando o rei entrou para ver os convidados observou ali um homem que não estava usando traje de festa…”.

Como se pode ver neste versículo, a parábola mostra certas situações irreais cujo objetivo é fazer os ouvintes refletirem. Por um lado, não é plausível imaginar um rei tomando semelhante atitude; por outro, não existia naquela época um traje próprio para participar de uma festa de casamento.

Entretanto, esta cena expressa uma claríssima alegoria do Juízo, pois o rei vai mandar amarrar os pés e as mãos desse convidado e lançá-lo às trevas exteriores, onde “haverá choro e ranger de dentes”.

Ora, o que significa esse “traje de festa”? A interpretação dos exegetas e teólogos coincide em identificá-lo com o estado de graça, no qual deve estar a alma para entrar no Reino dos Céus. Segundo Santo Hilário, ele representa “a graça do Espírito Santo e o candor do hábito celestial que, uma vez recebido pela confissão da Fé, deve ser conservado limpo e íntegro até a entrada no Reino dos Céus”.10 E para São Jerônimo simboliza “a Lei de Deus e as ações praticadas em virtude da Lei e do Evangelho, que constituem o traje do homem novo; se no dia do Juízo algum cristão estiver sem ele, será castigado imediatamente”.11

“O Juízo Final” – Pórtico da Catedral de Notre Dame, Paris

12a “…e perguntou-lhe: ‘Amigo, como entraste aqui sem o traje de festa?’”.

Chama a atenção a fórmula usada pelo rei. Pois, enquanto o tom da pergunta demonstra uma censura àquele convidado, o rei começa por chamá-lo de “amigo”.

São Jerônimo nos dá esta explicação: “Chama-o de amigo porque tinha sido convidado para as bodas (e era realmente, pela Fé), mas o repreende por seu atrevimento em entrar assim na festa, enfeando-a com suas vestimentas sujas”.12 Ou seja, o fato de estar na sala do banquete indica tratar-se de uma pessoa que tem o sinal do Batismo, mas não correspondeu à graça do chamado divino. “Entra para as bodas sem as vestes nupciais aquele que acredita na Igreja, mas não tem a caridade”, ensina São Gregório Magno.13

Convém esclarecer, como faz Maldonado, que “tudo isso acontece no dia do Juízo, quando Deus expulsa do banquete — isto é, do Reino dos Céus — aqueles que têm a Fé, mas sem as obras; obviamente, eles não estavam no Céu, porém, estando na Igreja, encontravam-se virtualmente no Céu e, se tivessem boas obras, teriam passado da Igreja para o Céu”.14

De fato, pertencer à Igreja não é garantia automática de salvação. Mesmo entre os bons, às vezes se esgueiram alguns maus que recusam o verdadeiro banquete, como ocorreu com Judas entre os Apóstolos e com as heresias nascidas no seio da própria Igreja, já nas catacumbas. É a contingência deste vale de lágrimas, no qual os homens se encontram “in via”, em estado de prova. “Assim, os bons não estão sós, a não ser no Céu; tampouco os maus jamais estão sós, a não ser no inferno. Mas esta vida que se encontra entre o Céu e o inferno, estando em meio de ambos, recebe indistintamente cidadãos de ambos os lados; a Santa Igreja os recebe agora indistintamente, mas os separa na hora de sair. […] Assim, pois, na Igreja Católica nem os maus podem estar sem os bons, nem estes sem aqueles”15 — explica São Gregório Magno.

“Jesus crucificado” – Igreja de Nossa Senhora dos Anjos da Porciúncula, Bogotá (Colômbia)

Implacabilidade da própria consciência do pecador

12b “Mas o homem nada respondeu”.

“O homem nada respondeu”, porque o Juízo de Deus é justíssimo e irrecorrível. Pergunta, a esse propósito, Santo Afonso Maria de Ligório: “Que responderá o pecador em presença de Jesus Cristo? Ou melhor, que poderá responder ao ver-se culpado de tantos crimes? Calar-se-á confuso, como se calava o homem referido no Evangelho de São Mateus, encontrado sem o traje de bodas: ‘Ele não abriu os lábios’. Seus próprios pecados taparam-lhe a boca […] Concluamos, portanto, com toda razão, que a alma ré de pecado, ao sair da vida e antes de ouvir a sentença, condena-se ela mesma ao inferno”.16

Com efeito, ensina-nos a Doutrina Católica que na hora do Juízo particular a própria consciência acusa a pessoa: “É pela recusa da graça nesta vida que cada um já se julga a si mesmo, recebe de acordo com suas obras e pode até condenar-se para a eternidade ao recusar o Espírito de amor”.17

A sentença de Deus é uma confirmação do julgamento feito pela própria consciência. Em suas pregações a respeito do dia do Juízo, Santo Antonio Maria Claret comenta: “Postar-se-ão diante do réu pecador todos os seus pecados, provando-lhe e convencendo-o que são de fato dele, e confundindo-o com esse conhecimento. […] Cada um dos pecados cometidos se mostrará ali como numa tela, com toda a sua gravidade, não de maneira confusa, mas com toda a clareza […]. Oh! consciência, consciência! Quem não treme ante tua espantosa acusação?”.18

13  Então o rei disse aos que serviam: ‘Amarrai os pés e as mãos desse homem e jogai-o fora, na escuridão! Ali haverá choro e ranger de dentes’”.

Transparecem mais ainda, neste trecho do Evangelho, a majestosa grandeza e a implacável justiça divina. O homem que estava sem veste nupcial é jogado nas trevas exteriores, as quais figuram, segundo expressão de São Gregório Magno, a “noite eterna da condenação”.19

Na hora em que o rei entrar no banquete — ou seja, na hora do Juízo —, quem estiver em estado de pecado mortal será lançado no fogo do inferno, de mãos e pés amarrados; e ali haverá choro e ranger de dentes por toda a eternidade.

Nem todos aceitam o convite

14  “Porque muitos são chamados, e poucos são escolhidos”.

Todos são chamados a fazer parte do banquete espiritual e receber o Rei eterno com a veste própria da festa nupcial. Pois “Deus quer que todos os homens sejam salvos e cheguem ao conhecimento da verdade” (I Tim 2, 4), ensina o Apóstolo. Entretanto, poucos são os escolhidos.

Nosso Senhor morreu na Cruz para abrir a todos os homens as portas do Reino dos Céus. Mas, infelizmente, nem todos aceitam o convite.

Imagem Peregrina do Imaculado Coração de Maria pertencente aos Arautos do Evangelho

III – Esperança no Reino de Maria

O chamado feito por Jesus nesta rica parábola continua ecoando hoje nas encruzilhadas dos caminhos, para os bons e para os maus, conclamando a uma atitude de retidão e vigilância. Porém, jamais poderemos estar com a alma inteiramente pronta na expectativa da grande festa que vai se dar sem praticarmos a virtude teologal da Esperança, tão importante quanto as da caridade e da fé.

Nascemos para a eternidade e devemos ter os olhos postos nesse último objetivo que é o Céu. Mas, o homem vive no tempo. Deus, então, para alimentar nossa Esperança nesta vida nos coloca diante de perspectivas mais ou menos próximas, que remetem depois para a eternidade.

De fato, hoje a Providência quer que vivamos em função da esperança do banquete para o qual Deus vem atraindo insistentemente a humanidade: o triunfo do Imaculado Coração de Maria predito em Fátima.

Como será possível transformar nossa atual quadra histórica, tão afastada de Deus, no esplendor do Reino de Maria em que, segundo o grande São Luís Maria Grignion de Montfort, “as almas respirarão Maria como o corpo respira o ar?”.20 Sem dúvida, pela oração e pela penitência, tão reiteradas vezes pedidas por Nossa Senhora, há de se operar uma verdadeira mudança dos corações.

Entretanto, não devemos imaginar que tal renovação possa se efetuar num ato instantâneo, mas sim processivamente, por onde, quer as almas inocentes, quer aquelas que recebem, por especial graça, a restauração da inocência perdida, vão aos poucos constituindo uma nova era.

Assim como por ocasião da festa do casamento do Filho de Deus com a humanidade, em relação ao banquete do Reino de Maria não podemos alegar as ocupações que nos prendem ao mundo. E muito menos agredir a quem no-lo anuncia, neste caso, a própria Santíssima Virgem, que em Fátima nos chamou a seguir seus caminhos. Temos de aceitar essa solicitação que, mais do que um simples convite, é uma imposição, porque vem de Alguém infinitamente superior a qualquer rei da Antiguidade, o próprio Deus.

Estejamos sempre atentos à Palavra de Deus que nos convida ao banquete, e prestemos ouvidos à voz da consciência a nos advertir interiormente, a fim de não mancharmos a bela veste nupcial da vida da graça, para podermos entrar no festim eterno da visão beatífica onde, juntamente com Maria Santíssima, o próprio Deus será a nossa recompensa demasiadamente grande (cf. Gn 15,1).

 

Notas


1 BENTO XVI. Jesus de Nazaré – Do batismo no Jordão à Transfiguração. São Paulo: Planeta, 2007, p.58.
2 LÉON-DUFOUR, SJ, Xavier. Vocabulario de Teología Bíblica. Barcelona: Herder, 1965, p.570. Ver, no mesmo sentido: SÃO TOMÁS DE AQUINO. Suma Teológica, III, q.42, a.3, resp.
3 SÃO GREGÓRIO MAGNO, Homiliarum in Evangelia. 38, c.3.
4 FILLION, Louis-Claude. La Sainte Bible commentée. Paris: Letouzey et Ané, 1912, t.VII, p.143-144.
5 GOMA Y TOMÁS, Isidro. El Evangelio explicado. Barcelona: Rafael Casulleras, 1930, v.IV, p.47.
6 Cf. SANTO AGOSTINHO. De Civitate Dei, l.XIV, c.28.
7 São Remígio, apud SÃO TOMÁS DE AQUINO. Catena Aurea – Expositio in Matthaeum. c.22, l.1.
8 ORBE, SJ, Antonio. Parábolas Evangélicas en San Ireneo. Madrid: BAC, 1972, v.II, p.282.
9 GOMÁ Y TOMÁS, op. cit., p.48.
10 SANTO HILÁRIO. Commentarius in Matthaeum, 22, c.7
11 SÃO JERÔNIMO, apud SÃO TOMÁS DE AQUINO, Catena Aurea, ibidem.
12 Idem, ibidem.
13 SÃO GREGÓRIO MAGNO, op. cit., 38, c.9.
14 MALDONADO, SJ, Juan de. Comentarios a los cuatro Evangelios – San Mateo. Madrid: BAC, 1960, v.I, p.765-766.
15 SÃO GREGÓRIO MAGNO, op. cit., 38, c.7.
16 SANTO AFONSO MARIA DE LIGÓRIO. Obras Ascéticas. Madrid: BAC, 1954, v.II, p.648-649.
17 CIC 679.
18 SANTO ANTÔNIO MARIA CLARET. Sermones de Misión. Barcelona: Librería Religiosa, 1864, v.II, p.47.
19 SÃO GREGÓRIO MAGNO, op. cit., 38, c.13.
20 SÃO LUÍS GRIGNION DE MONTFORT. Tratado da verdadeira devoção à Santíssima Virgem, n.217.
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Mons. João Scognamiglio Clá Dias, EP
Mons. João Scognamiglio Clá Dias, EP, é fundador dos Arautos do Evangelho.

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