Se da ação do Espírito Santo em Pentecostes nasceram tantas belezas da cultura e da civilização e, sobretudo, tantos milagres da graça, o que não aconteceria se houvesse um novo sopro do Paráclito sobre a face da Terra?

 

Incansável, ardendo de zelo pela glória de Deus, o Apóstolo Paulo percorria as cidades da Grécia, pregando a todos o Evangelho de Cristo. Por vezes, a hostilidade de muitos se opunha a seu apostolado e atentava contra sua vida. Grande era, entretanto, o consolo que lhe proporcionavam as numerosas conversões. Chegando a Atenas — cidade rica e orgulhosa, centro da filosofia e do intelectualismo — o coração do Apóstolo das Gentes encheu-se de amargura, à vista de tanta idolatria (cf. At 17, 16). Entre os múltiplos locais de culto, onde eram oferecidos sacrifícios às divindades mais absurdas, deparou ele com um altar no qual figurava esta inscrição: “A um deus desconhecido”. Chocado ante a ignorância daquele povo, sem embargo tão inteligente, Paulo pôs-se a pregar no Areópago, exclamando: “O que adorais sem o conhecer, eu vo-lo anuncio!” (At 17, 23). E logo os iniciou no conhecimento da verdadeira religião.

Nos dias de hoje, em nosso Ocidente cristão, não vemos mais aqueles templos destinados à adoração dos ídolos, pobres imagens feitas por mãos humanas. Pelo contrário, passados quase dois mil anos de pregação apostólica, continuada fielmente pelo Magistério, erguem-se agora numerosos templos cristãos, ostentando no alto de ­suas torres o glorioso símbolo da cruz.

Entretanto, se a confissão de um só batismo e a crença na Trindade ­reúnem os cristãos, não faltam aqueles para os quais o Espírito Santo poderia chamar-Se o “Deus desconhecido”. Semelhantes aos discípulos de Éfeso que, interrogados por Paulo, responderam: “Nem sequer ouvimos dizer que há um Espírito Santo” (At 19, 2), muitos são hoje os que, sem chegar a esse extremo, desconhecem as características e os poderes do Paráclito e se esquecem de invocá-Lo.

“Pentecostes” por Beato Angélico, detalhe do “Armário das Pratas” – Museo de São Marcos, Florença

Quanto mais O conhecemos, mais O amamos

No Antigo Testamento, a humanidade ignorava a existência de Três Pessoas em uma única Essência Divina; e se algumas expressões dos Livros Sagrados faziam vislumbrar esse conhecimento, eram apenas lampejos de uma Revelação que Deus Se reservava transmitir por meio de Seu Filho, na plenitude dos tempos.

Errôneo seria julgar que a doutrina sobre o Espírito Santo não deveria ser difundida entre os fiéis, por temor de causar confusões ou desvios. Não foi este o exemplo dado pelo Salvador, ao prometer a vinda do Paráclito ou ao explicar tal mistério ao velho Nicodemos, que não chegava a compreendê-lo. Também não foi essa a conduta observada pelos discípulos de Jesus ao escreverem repetidas vezes sobre a ação e a presença da Terceira Pessoa Divina no seio da Igreja.

Em sua Encíclica Divinum illud munus, o Santo Padre Leão XIII exortava aos pregadores a ensinar e inculcar essa devoção no povo cristão, visto que seus frutos haviam se revelado abundantes e profícuos:

“Insistimos nisso não só por tratar-se de um mistério que nos prepara diretamente para a vida eterna e que, por isso, é necessário crer firme e expressamente, mas também porque, quanto mais clara e plenamente conhecemos o bem, mais intensamente o queremos e o amamos. Isso é o que agora queremos recomendar-vos. Devemos amar o Espírito Santo, porque é Deus: ‘Amarás o Senhor teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma e de todas as tuas forças’ (Dt 6, 5). E deve ser amado porque é o Amor substancial eterno e primeiro, e não há coisa mais amável que o amor; portanto, tanto mais devemos amá-Lo quanto Ele nos cumulou de imensos benefícios que, se testemunham a benevolência do doador, exigem a gratidão da alma que os recebe” (Divinum illud munus, 13).

Entender com o coração, e não apenas com o intelecto

Ao procurar nos aprofundar no conhecimento desse Divino Espírito, a quem a Igreja invoca como “Luz dos corações”, façamo-lo não apenas por um exercício do intelecto, mas compreendendo, sobretudo, com o coração.

A inteligência, como explica São Tomás, é potência régia e imóvel: traz a si o objeto sobre o qual ela se aplica e o torna proporcionado à sua capacidade. Se esse objeto é superior à razão, ela forçosamente o diminuirá ao adaptá-lo a si. A vontade percorre o caminho inverso: naturalmente inclinada à entrega e à doação de si mesma, ela voa até o objeto e adquire suas proporções. Quando este se manifesta superior, ela se alarga e cresce até tomar as suas medidas.

Ora, no caso do Espírito Santo, não se trata de um objeto apenas superior ao pobre entendimento humano, mas de um Ser infinitamente distante de nossa frágil natureza. É necessário voarmos a Ele com a vontade, amando-O sem medida até nos tornarmos “deuses”, como Ele mesmo afirma nas Escrituras (cf. Sl 81, 6; Jo 10, 34-35). Deste modo, estaremos aptos para anunciá-Lo àqueles que ainda não O conhecem, conforme a expressão de Lacordaire: “La raison ne fait que parler, c’est l’amour qui chante!” — A razão só sabe falar, é o amor que canta!

Dupla influência e divina inabitação

Para conhecer o Espírito Santo e se relacionar com Ele, não necessitam os batizados voar muito longe, pois, se bem Ele “habita nos céus” (Sl 122, 1), também Se encontra próximo às almas em estado de graça, exercendo sobre elas uma dupla influência.

Pela primeira, íntima e direta, comunica-lhes seus dons, purifica-as das misérias, inspira-lhes os bons propósitos… Essas almas se tornam, assim, semelhantes a um navio prestes a zarpar: o sopro de uma suave brisa enfunará suas velas e o conduzirá a bom porto. Sem dúvida, ao criar o vento, fê-lo Deus com o intuito de simbolizar esta ação do Espírito Santo no interior dos corações, como o indicou o próprio Jesus ao fariseu Nicodemos: “O vento sopra onde quer; ouves-lhe o ruído, mas não sabes de onde vem, nem para onde vai. Assim acontece com aqueles que nascem do Espírito” (Jo 3, 8).

A segunda influência que dEle vem manifesta-se por meio do magistério da Igreja, da palavra infalível dos Pontífices ou do ensinamento dos Bispos, pelos quais o povo fiel é guiado. “O Espírito Santo — afirma ainda Leão XIII —, que é espírito de verdade, pois procede do Pai, Verdade eterna, e do Filho, Verdade substancial, recebe de um e de outro, juntamente com a essência, toda a verdade que em seguida comunica à Igreja, assistindo-a para que jamais erre, e fecundando os germes da revelação até que, no momento oportuno, cheguem à maturidade para a salvação dos povos” (Divinum illud munus, 7).

A alma que se abre às inspirações do Espírito, ao mesmo tempo em que é iluminada pela doutrina da ­Igreja, torna-se, de certo modo, inerrante. Essa misteriosa atuação do Espírito Santo passa por cima de todas as fraquezas e misérias, transformando completamente aqueles que a recebem. Para os corações assim renovados, a única lei consistirá em obedecer ao dulcis Hospes animæ (doce Hóspede da alma), deixando-O operar no seu interior, como recomendava insistentemente a santa carmelita, Madre Maravillas de Jesús, a cada uma das suas filhas espirituais: “Si tú Le dejas…” — Se você Lhe permitir…

Apesar de ser sabido que a presença de Deus, enquanto Pai e Amigo, nas almas dos batizados compete às três Pessoas da Santíssima Trindade, uma vez que estas sempre atuam em conjunto, atribui-se a inabitação especialmente ao Divino Espírito Santo, pois esta dá-se pelo amor e efetua-se apenas nas almas em estado de graça. Ora, o Espírito Santo é o amor substancial, porque procede da união eterna e amorosa entre o Pai e o Filho.

São Paulo, ao referir-se a essa divina inabitação, mostra-se ainda mais ousado, não a restringindo apenas à alma, mas, considerando seus reflexos no próprio corpo: “Não sabeis que o vosso corpo é templo do Espírito Santo, que habita em vós?” (I Cor 6, 19).

Catedral de Notre-Dame vista do rio Sena, Paris – Foto: Francisco Lecaros

Transformação dos Apóstolos em Pentecostes

Muitas vezes, a ação do Espírito Santo nas almas faz-se de modo suave e paulatino, na medida em que estas não lhe oponham obstáculos, purificando-as de suas culpas e convidando-as a progredir sempre mais na virtude. Em outras ocasiões, porém, essa transformação se opera de modo súbito e fulminante. Tal foi o caso dos Apóstolos.

Durante a Paixão de Jesus, eles revelaram toda a pusilanimidade própria à natureza humana. Temerosos de sofrer o mesmo destino do Mestre, tinham fugido, abandonando-O no momento em que Ele mais necessitava de sua companhia. E se, após aqueles dias de tragédia, ainda se conservavam reunidos no Cenáculo, isto se devia às preces e à ação da Santíssima Virgem, bem como às aparições do Senhor ressurrecto.

Seus corações permaneciam ainda vacilantes, seus bons desejos, mesclados à ambição pelo primeiro lugar, não eram perfeitos e eles mesmos deveriam experimentar um sentimento de indignidade em relação à grandeza da obra que o Senhor lhes confiara. Entretanto, uma esperança os mantinha juntos, perseverando unânimes na oração (cf. At 1,14): era a promessa feita sob juramento pelo próprio Cristo: “Digo-vos a verdade: convém a vós que eu vá! Porque se eu não for, o Paráclito não virá a vós; mas se eu for, vo-lo enviarei” (Jo 16, 7).

Sim, era necessário que Jesus fosse para que viesse o Espírito; convinha que os discípulos, cuja visão do Mestre era por demais humana, sentissem o vazio criado pela Sua ausência e compreendessem, agora distanciados, a origem divina dAquele que os congregara. Essa nova perspectiva só seria atingida por ação do Paráclito que lhes ensinaria “toda a verdade” (Jo 16, 13).

Assim, dez dias após sua ascensão aos céus, realizando a profecia que Ele mesmo fizera, o Filho enviava sobre os discípulos o Defensor prometido. Por cuja ação repentina e eficaz aqueles homens tímidos e cheios de lacunas foram transformados em verdadeiras colunas da Fé. Simão Pedro, que havia poucas semanas negara seu Senhor por medo de uma criada, não temia agora pregar esse mesmo Crucificado às portas do Templo. Tiago e João, os boanerges, de temperamento colérico e ambicioso, tornavam-se os paladinos da doçura, Apóstolos do “novo mandamento do amor”. Tomé, o incrédulo, faria chegar sua palavra ardorosa até os confins longínquos da Índia. Que força inexplicável para olhos humanos movia-os agora, impelindo-os a conquistar o mundo para Cristo? Que misterioso poder os cumulara de uma nova infusão de dons e dos mais preciosos carismas?

Fora, ouvira-se um ruído insólito, vindo do céu, semelhante ao de um vento impetuoso, ao mesmo tempo em que sobre a cabeça de cada um repousara uma língua de fogo. Estes sinais exteriores, que confirmavam a mudança operada em seus espíritos eram símbolos da graça outorgada, do ímpeto da caridade e da grandeza de Deus que descia. O vento, ao qual Jesus já fizera alusão na conversa noturna com Nicodemos (cf. Jo 3, 8), figurava as inspirações repentinas enviadas pelo Espírito, enquanto as línguas, inundando de ígneo resplendor a sala do Cenáculo, indicavam a plenitude de Fé e amor que convinha aos anunciadores da Palavra de Deus.

Dons e frutos do Espírito Santo

Para compreender bem a importância desse acontecimento, cuja comemoração encerra o Ciclo Pascal, é necessário conhecer a magnitude dos dons que ali foram concedidos, não só pessoalmente aos discípulos, mas a toda a Igreja, perpetuando-se pelos Sacramentos do Batismo e do Crisma.

Pelas virtudes infusas, a alma age segundo seu livre-arbítrio auxiliado pela graça, à maneira de um pássaro que voa pelo esforço próprio de suas asas. Os dons, porém, dispõem-na para deixar-se conduzir diretamente sob o impulso do Espírito Santo, como nuvem que se movimenta ao menor sopro de brisa: “Quem são estes, que voam como nuvens?” (Is 60, 8).

Sete são os dons que provêm do Espírito e adornam a alma, conferindo-lhe beleza e atração. Por eles, segundo explicam os Santos Padres e os teólogos, adquire-se força para resistir às principais tentações e afastam-se os obstáculos à vida de perfeição. Quatro desses dons têm por finalidade iluminar a inteligência, enquanto os outros três põem em movimento a vontade.

O dom de sabedoria ilustra a alma para o conhecimento de Deus e a contemplação de seus adoráveis atributos; o dom da ciência faz penetrar com discernimento nas criaturas e julgá-las de modo acertado; o dom de entendimento permite compreender os mistérios divinos; e o dom de conselho rege as ações, de modo a usar ordenadamente os conhecimentos anteriores.

Já o dom de fortaleza opera no campo da vontade, aperfeiçoando a virtude do mesmo nome e robustecendo-a contra o vão temor mundano; o dom da piedade inclina ao amor de Deus e à caridade para com o próximo; por fim, o santo temor opõe-se às inclinações de orgulho e soberba, tão enraizadas no coração humano.

A alma que se deixa inundar pela ação do Espírito Santo não tardará em produzir frutos de santidade, que espargirão ao seu redor o bom odor de Cristo e comunicarão à sua pessoa um encanto todo espiritual. Em seu coração reinarão a paz e a mansidão, a bondade transparecerá no seu relacionamento com os outros, a modéstia brilhará no seu comportamento e o gozo pela posse do Amado acompanha-la-á constantemente. É por isto que o Espírito Santo é chamado também o Espírito da alegria, pois Sua presença e ­atuação vêm sempre seguidas de um bem-estar interior que, por vezes, reflete-se no próprio físico, e que constitui o verdadeiro tesouro dos santos. São Paulo, em sua carta aos Gálatas, enumera esses frutos do Espírito e em seguida aconselha: “Se vivemos pelo Espírito, andemos também de acordo com o Espírito” (Gl 5, 25).

A alma da Igreja

Aqui tocamos nos umbrais de um mistério que envolve a História da Igreja e tem sido causa de confusão e desconcerto para aqueles que se esforçam por destruí-la. Ao prometer a Pedro que as portas do inferno não prevaleceriam contra Sua Igreja, Jesus não falava da parte humana, desta que, por vezes, tem se revelado tão frágil e sujeita a misérias. Referia-se sim, à parte divina, que é a que confere à Esposa Mística de Cristo seu caráter triunfante e imortal.

A alma da Igreja é a Terceira Pessoa da Santíssima Trindade, o Defensor prometido e enviado, que a santifica e enriquece pela ação de Sua graça e Seus dons, impedindo que Ela venha a sucumbir, ou até mesmo enlanguescer, sob os reiterados ataques de seus adversários. No Paráclito encontramos a explicação do grande segredo pelo qual a Igreja “toda gloriosa, sem mácula, sem ruga, sem qualquer outro defeito semelhante, mas santa e irrepreensível” (Ef 5, 27) continua seu cortejo vitorioso ao longo dos séculos, engendrando novos filhos e levando sua doutrina até os confins do mundo. Compreendemos, então, de onde provém o ensinamento infalível dos Papas durante quase dois milênios, o surgimento de novos carismas sempre que suas necessidades o requerem, o incessante florescer de almas santas que, como outros Cristos, prolongam por meio do exemplo sua adorável presença na Terra: “Eis que estou convosco todos os dias, até o fim do mundo” (Mt 28, 20).

“A glória do Espírito Santo” – Museu de Arte Sacra, Rio de Janeiro

Antes e depois de Cristo

O mundo, antes da vinda de Nosso Senhor Jesus Cristo, estava numa decadência enorme, pode-se dizer que a humanidade tinha alcançado um auge de maldade inimaginável: por todas as partes imperava a idolatria, observavam-se os costumes mais depravados e a degradação da dignidade atingira profundidades nunca vistas. Se nossos primeiros pais, Adão e Eva, ainda vivessem naquela época, não poderiam crer que, por um só pecado cometido, sua descendência houvesse chegado à situação em que se encontrava no tempo do nascimento de Jesus.

A Encarnação de Nosso Senhor foi um marco histórico que dividiu as eras em antes e depois de Cristo. O fato da Segunda Pessoa da Santíssima Trindade ter assumido a nossa carne e, após cumprir Sua missão redentora, ter subido aos Céus e enviado o Espírito Santo, mudou a face da Terra.

Foi do Cristianismo que surgiram as catedrais, os castelos e os palácios, o esplendor da liturgia, a suavidade do canto gregoriano e a grave harmonia do órgão; dele nasceram as universidades, as ordens religiosas e as instituições de caridade, floresceram entre os homens o trato afável e respeitoso e a pureza dos costumes. Em uma palavra, aquela infusão do Espírito Santo, descido sobre os Apóstolos em Pentecostes, deu origem ao que poderíamos chamar de “espírito da Igreja”. Ele é tão inefável que não podemos descrevê-lo com palavras, mas tão real e verdadeiro que o sentimos tocar o fundo de nossas almas, fazendo-nos crescer no conhecimento e no amor pela Esposa Mística de Cristo.

Enviai o vosso Espírito criador!

O mundo de hoje se encontra numa decadência semelhante — talvez até pior — à dos tempos evangélicos. Os homens parecem estar surdos à voz do Espírito Santo e se afundam cada vez mais no pecado e no esquecimento de Deus. Hoje, mais do que nunca, o “espírito do erro”, ao qual se refere São Paulo em sua epístola a Timóteo (cf. I Tm 4, 1) pervade as mentalidades no mundo, infiltrando-se nas atividades humanas pelos mais variados meios.

Esse “espírito do erro” ostenta um dinamismo desconhecido e insinuante, grandemente nocivo à salvação das almas. E não deixa de ser uma hábil artimanha do demônio, que se aproveita da fraqueza dos bons para alcançar aparentes vitórias. Engana-se com elas o pai da mentira, pois o inimigo contra o qual ele em vão teima em lutar, não é um estado de espírito ou um modo de ser, e nem sequer um ser humano; é, isto sim, uma Pessoa substancialmente divina, o Espírito da Verdade e do Amor. Basta Ele intervir para que seja revertida a situação e infligir uma derrota decisiva às forças infernais.

Por isso a Igreja, na pessoa de seus fiéis, reza há vinte séculos a súplica do salmista: “Emitte spiritum tuum et creabuntur et renovabis faciem terræ” — Enviai o vosso Espírito criador e renovareis a face da Terra (Sl 103, 30). Bastaria que Nosso Senhor, a rogos de Maria Santíssima, enviasse o Espírito Santo sobre a Terra, para haver uma radical mudança. Que maravilhas poderiam ainda vir, depois desse acontecimento? Se da primeira vinda nasceram tantas belezas da cultura e da civilização e, sobretudo, tantos milagres da graça — como testemunha a longa coorte de mártires, confessores, doutores e virgens que já gozam na eternidade — o que não aconteceria se houvesse um novo sopro do Paráclito sobre a face da terra?

Tesouro da Oração

Consagração ao Espírito Santo

Ó Espírito Santo, laço divino que unis o Filho ao Pai num inefável e estreitíssimo laço de amor! Espírito de luz e de verdade, dignai-Vos derramar toda a plenitude de vossos dons sobre minha pobre alma, que solenemente Vos consagro para sempre, a fim de que sejais seu preceptor, seu diretor e seu mestre. Peço-Vos humildemente fidelidade a todos os vossos desejos e inspirações, e entrega completa e amorosa a vossa divina ação. Ó Espírito Criador! Vinde, vinde operar em mim a renovação pela qual ardentemente suspiro; renovação e transformação tal que seja como uma nova criação, toda de graça, de pureza e de amor, com a qual inicie deveras a vida inteiramente espiritual, celestial, angélica e divina que pede minha vocação cristã.

Espírito de santidade, concedei à minha alma o contato de vossa pureza, e ficará mais branca do que a neve! Fonte sagrada de inocência, de candura e de virgindade, dai-me a beber de vossa água divina, apagai a sede de pureza que me abrasa, batizando-me com aquele batismo de fogo cujo divino batistério é vossa divindade, sois Vós mesmo! Envolvei todo o meu ser com vossas chamas puríssimas. Destruí, devorai, consumi nos ardores do puro amor tudo quanto haja em mim que seja imperfeito, terreno e humano; quanto não seja digno de Vós.

Que vossa divina unção renove minha consagração como templo de toda a Santíssima Trindade e como membro vivo de Jesus Cristo, a Quem, com maior perfeição ainda que até aqui, ofereço minha alma, corpo, potências e sentidos com tudo quanto sou e tenho. Feri-me de amor, ó Espírito Santo, com um desses toques íntimos e substanciais, para que, à maneira de seta incandescente, fira e transpasse meu coração, fazendo-me morrer para mim mesmo e para tudo o que não seja o Amado. Trânsito feliz e misterioso que só Vós podeis produzir, ó Espírito divino, o qual anelo e peço humildemente.

Como um carro de fogo divino, arrebatai-me da Terra ao Céu, de mim mesmo para Deus, fazendo-me que desde já more naquele paraíso que é o seu Coração.

Infundi-me o verdadeiro espírito de minha vocação e as grandes virtudes que exige e são penhor seguro de santidade: o amor à cruz e à humilhação e o desprezo de tudo quanto é transitório. Dai-me, sobretudo, uma humildade profundíssima e um santo ódio contra mim mesmo. Ordenai em mim a caridade e embriagai-me com o vinho que engendra virgens.

Que meu amor a Jesus seja perfeitíssimo, até chegar à completa alienação de mim mesmo, àquela celestial loucura que faz perder o senso humano de todas as coisas, para seguir as luzes da Fé e os impulsos da graça.

Recebei-me, pois, ó Espírito Santo, que de todo e por completo me entregue a Vós. Possuí-me, admiti-me nas castíssimas delícias de vossa união, e nela desfaleça e expire de puro amor ao receber o vosso ósculo de paz. Amém.

(ROYO MARÍN, OP, Fr. Antonio. El gran desconocido – El Espíritu Santo y sus dones.
2 ed. Madri: BAC, 2004. Tradução: Arautos do Evangelho)

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