Um antigo intérprete do Cântico dos Cânticos, comentando o texto: “Apascenta os meus cabritos”, não vê nenhuma dificuldade em aplicá-lo a Maria a propósito dos pecadores.
Os pecadores – diz – são justamente parte do rebanho de Maria. Não porque Ela os queira tal como são, destinados a ser colocados à esquerda do Juiz, mas porque Ela os adota para garantir-lhes um lugar à direita, transformando-os em fiéis cordeiros […]
Não há dúvida de que o cordeiro é preferível ao cabrito. Da mesma maneira, nada vale tanto como a candura de uma alma inocente; felizes os que, semelhantes a um cordeiro sem mancha, merecem as carícias da Virgem das virgens, que tem por um dos seus títulos o de “Divina Pastora”. Mas resta aos pecadores um imenso consolo: confessando-se merecedores de estar à esquerda do Juiz, depende unicamente deles recorrer com confiança a Maria, passar a fazer parte do seu rebanho e converter-se prontamente em cordeiros. […]
Por muito doentes que estejamos, por mais desesperador que pareça o estado de nossa alma, se quisermos curar-nos, Maria adotar-nos-á como seus doentes. E como não existe doença espiritual que seja incurável nesta vida e nenhuma pode resistir ao tratamento da todo-poderosa Mãe de Deus, Ela nos curará. A sua glória, como a de um médico hábil, brilhará na proporção da gravidade dos males de que nos tenha salvo.
Depois, uma vez curados e arrancados à morte, enquanto durarem os perigos de uma convalescença que será tão longa como a nossa vida, esta doce Mãe há de amar-nos sempre e velar por nós, como o médico continua a acompanhar os seus doentes depois de curados. Teremos um título mais especial para contar com a sua proteção maternal. ◊
TISSOT, Joseph. “A arte de aproveitar as próprias faltas”.
3.ed. São Paulo: Quadrante, 2003, p.124-125
Na foto em destaque: A Divina Pastora, por Miguel Cabrera – Museu Nacional de Arte, Cidade do México