Antes de ser flagelado, coroado de espinhos e crucificado, Nosso Senhor Jesus Cristo declara diante de Pilatos a sua soberania sobre toda a criação: “Eu sou Rei”.
Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo
Naquele tempo, 33b Pilatos chamou Jesus e perguntou-Lhe: “Tu és o Rei dos judeus?” 34 Jesus respondeu: “Estás dizendo isto por ti mesmo, ou outros te disseram isto de Mim?” 35 Pilatos falou: “Por acaso, sou judeu? O teu povo e os sumos sacerdotes Te entregaram a mim. Que fizeste?” 36 Jesus respondeu: “O meu Reino não é deste mundo. Se o meu Reino fosse deste mundo, os meus guardas lutariam para que Eu não fosse entregue aos judeus. Mas o meu Reino não é daqui”. 37 Pilatos disse a Jesus: “Então, Tu és Rei?” Jesus respondeu: “Tu o dizes: Eu sou Rei. Eu nasci e vim ao mundo para isto: para dar testemunho da verdade. Todo aquele que é da verdade escuta a minha voz” (Jo 18, 33b-37).
I – A mais autêntica das monarquias
Ao percorrer as páginas do Antigo Testamento, um dos episódios da história da nação eleita atrai a atenção de modo especial. Qual seu verdadeiro significado?
Em determinado momento, os israelitas sentem-se inferiorizados em relação aos outros povos governados por reis, enquanto eles vivem num regime teocrático, conduzidos por Deus através dos juízes. Então, pedem um monarca a Samuel. Discutem com o profeta, que se toma de indignação, mas são afinal atendidos nos seus anseios. Por fim, é chegada a hora de estabelecer o novo regime e Deus mesmo manda Samuel ungir Saul como rei (cf. I Sm 8, 4-22; 9, 17; 10, 1).
Ora, esta monarquia, assim instituída, nasce de uma infidelidade, e as palavras divinas, explicando ao último juiz de Israel as razões que levam o povo a agir desta maneira, não deixam lugar a dúvidas: “Não é a ti que eles rejeitam, mas a Mim, pois já não querem que Eu reine sobre eles” (I Sm 8, 7). Portanto, a nação eleita não quer mais ser governada diretamente por Deus. Acrescente-se ainda que as vantagens do personagem escolhido parecem ser bastante terrenas e naturais: “Não havia em Israel outro mais belo do que ele; dos ombros para cima sobressaía a todo o povo” (I Sm 9, 2). A julgar pela descrição, bastou apenas uma apresentação física de destaque e 30 cm de estatura a mais que o comum dos homens para conferir a Saul o título da supremacia.
Entretanto, podem-se fazer conjecturas sobre as causas do ocorrido. Não teria Deus inspirado no fundo da alma dos israelitas o desejo, talvez implícito, de uma realeza a ser instaurada de forma inédita na face da Terra e, de certo modo, ligada à eternidade? Não esperavam eles um rei muito acima de qualquer imaginação humana? Sob o influxo de tal inspiração, bem diferente deveria ter sido a formulação da súplica dos anciãos ao profeta: “Samuel, intercedei por nós junto a Deus! Esses reis, que governam outras nações, são homens miseráveis, egoístas e ególatras, que desprezam a natureza humana e procuram escravizar os súditos, a seu serviço e para sua glória pessoal. Pedi ao Senhor um monarca como jamais foi dado a nenhum povo! Seja ele entre nós o reflexo da bondade divina! Reine sobre nós como o próprio Deus e obtenha-nos a mais bela manifestação de nossa teocracia”.
Mas eles, desvairados pelo anelo de “ser como todas as outras nações” (I Sm 8, 20), não souberam interpretar o sopro da graça. Muito pelo contrário, materializaram-no, dizendo tão só “Dá-nos um rei que nos governe” (I Sm 8, 5), e solicitaram a humanização daquilo que Deus certamente queria dar-lhes, com imensa abundância, no campo sobrenatural.
Porém, Deus Se aproveitará desta infidelidade para realizar a maior das maravilhas, incomparavelmente superior ao que os hebreus desejavam: uma vez fundada a monarquia em Israel e, depois, estabelecida a nova dinastia a partir de Davi, dela nascerá o verdadeiro Soberano, não só do povo judeu, mas de todo o universo. Rei de majestade e grandeza divina, cuja origem se perde na eternidade, que desce de alturas infinitas para nos salvar; Rei que dá o seu precioso Sangue pelos súditos: Cristo Rei, que celebramos nesta Solenidade.
II – Solene proclamação contra o relativismo
O Papa Pio XI1 ensina como, ao longo da História, as festas da Santa Igreja nasceram e foram se acrescentando ao Ano Litúrgico, instituídas e organizadas pela Cátedra infalível de Pedro com o intuito de beneficiar os fiéis em função das necessidades de cada época. Assim, ao cultuar os mártires, desde os primeiros tempos, a Liturgia incentivava à fidelidade, fazendo com que as pessoas se sentissem apoiadas pelo seu exemplo e não renegassem a Fé em circunstância alguma. Mais tarde, debeladas as perseguições pela ação da graça e entrando os cristãos num período de paz, também se comemoraram as virgens, os confessores e as viúvas, figuras inúmeras com as quais a Igreja se ia enriquecendo. Surgem então as festas de Nossa Senhora e, no fim da Idade Média, quando diminui o fervor pelo Santíssimo Sacramento, constitui-se uma celebração própria, com a finalidade de adorar o Corpo Sagrado de Nosso Senhor Jesus Cristo sob as Espécies Eucarísticas. Posteriormente, medrando a frieza rigorista que os erros do jansenismo propagaram, foi instituída a festividade do Sagrado Coração de Jesus. Incutir o ânimo e reacender a esperança da salvação eterna foi seu efeito.
Por fim, no dia 11 de dezembro de 1925, fazendo-se já sentir a terrível e avassaladora onda de laicismo que invadiria todos os países e levaria a humanidade a voltar as costas a Deus, no momento em que muitos católicos entregavam seu sangue em defesa de Cristo e de sua Igreja, o Papa Pio XI2 fez uso do poder conferido a Pedro com as chaves do Reino dos Céus, e proclamou com sua voz infalível: Cristo é Rei! A Encíclica Quas primas, estabelecendo a festa da realeza de Nosso Senhor Jesus Cristo no término do Ano Litúrgico,3 tinha um especial significado como oposição ao relativismo e ao ateísmo: declarava ao mundo que tudo tem seu fim e seu princípio em Cristo, Rei do Universo.
III – Jesus declara sua realeza
Na primeira leitura (Dn 7, 13-14) desta Liturgia, a visão de Daniel mostra-nos Nosso Senhor Jesus Cristo na manifestação de sua grandeza régia: “Foram-Lhe dados poder, glória e realeza, e todos os povos, nações e línguas O serviam” (Dn 7, 14a).
Com efeito, Ele é o Rei glorioso, coroado na eternidade e detentor da autoridade sobre toda a criação. Mas, paradoxalmente, o Evangelho de São João apresenta a figura deste Rei em situação de humilhação, com as mãos amarradas, prestes a ser flagelado, coroado de espinhos, condenado por seu próprio povo, morto e crucificado. E, então, inicia-se um dos mais belos diálogos de toda a Escritura.
O governador interroga o Todo-Poderoso
Naquele tempo, 33b Pilatos chamou Jesus e perguntou-Lhe: “Tu és o Rei dos judeus?”
Pela pergunta, percebe-se que o governador já ouvira as denúncias dos membros do Sinédrio contra o Divino Prisioneiro (cf. Mc 15, 3; Jo 18, 28-30) e desejava conhecer suas intenções. Pretenderia Ele subir ao trono de Israel e sublevar os judeus contra o domínio de Roma (cf. Lc 23, 1-2)? Ter-Se-ia arrogado, de fato, o título de Messias, quando foi aclamado pela multidão como Filho de Davi, ao entrar em
Jerusalém poucos dias antes (cf. Mc 11, 9-10)? Contudo, o romano via diante de si um Varão tão respeitável, virtuoso, equilibrado e submisso! Tratava-se realmente de um revolucionário?
34 Jesus respondeu: “Estás dizendo isto por ti mesmo, ou outros te disseram isto de Mim?”
A interrogação com a qual Jesus replica à de Pilatos é cheia de simbolismo. Este último se coloca como senhor absoluto em relação a Ele, uma vez que vai julgá-Lo. Ora, Jesus é o Todo-Poderoso e, se quisesse, faria seu interlocutor voltar ao nada, ou inclusive poderia apagá-lo da memória dos homens. Ele sabe que os judeus O caluniaram e que o governador age pressionado por eles, temendo ser prejudicado pelas suas intrigas junto ao imperador. Então responde-lhe calmamente, pondo-o diante do problema, como a admoestá-lo: “Isto vem do teu interior ou tens medo das calúnias que farão contra ti?”.
“Com estas palavras” ― comenta Teofilato ― “Jesus insinua que Pilatos é um juiz parcial, como se dissesse: ‘Se dizes isto por ti mesmo, apresenta os sinais de minha rebelião; se, todavia, ouviste isto de outros, abre um inquérito ordinário’”.4 E Santo Agostinho ressalta: “Jesus conhecia muito bem tanto a pergunta quanto a resposta que Lhe daria Pilatos. Quis, porém, que esta fosse expressa em palavras, não para que Ele a conhecesse, mas para que ficasse escrito o que desejava que nós soubéssemos”.5
Jesus, sinal de contradição
35 Pilatos falou: “Por acaso, sou judeu? O teu povo e os sumos sacerdotes Te entregaram a mim. Que fizeste?”
O governador ainda vai argumentar, alegando não estar concernido à prisão de Nosso Senhor, que a ele foi entregue pelos próprios judeus. Era esta a ocasião escolhida por Jesus para Se declarar Rei, apesar de estar em circunstâncias que sugeriam o oposto. Ele havia entrado em Jerusalém aclamado como Rei, mas tal aclamação correspondia a uma concepção baixa, naturalista e terrena da realeza. A nação queria carregar em triunfo um potentado deste mundo, um messias político, o qual, auxiliado por milagres, deveria obter-lhe uma salvação estritamente humana: a eliminação dos impostos e a supremacia sobre os romanos.
Em relação a esta mentalidade materialista, Nosso Senhor será pedra de escândalo e sinal de contradição (cf. Lc 2, 34). Diante de Pilatos, representante do poder supremo da época, Ele dará de Si mesmo e de sua autoridade régia uma visão muito diferente — a única válida —, toda sobrenatural, que será odiada e perseguida por não poucos no decurso de toda a História, mas permanecerá como signo do Cristianismo até o fim dos tempos.
A onipotência da verdade
36 Jesus respondeu: “O meu Reino não é deste mundo. Se o meu Reino fosse deste mundo, os meus guardas lutariam para que Eu não fosse entregue aos judeus. Mas o meu Reino não é daqui”.
Poderia alguém talvez concluir que, com esta revelação, Jesus havia renunciado ao seu domínio sobre o mundo. Carece de sentido tal afirmação sendo Ele o Onipotente, a quem está sujeito o universo inteiro. Ao contrário, quer lembrar que Ele é antes de tudo o Homem-Deus, como explica São Tomás, mencionando o pensamento de São João Crisóstomo sobre esta passagem do Evangelho: “Tu perguntas se sou Rei e Eu te digo que sim. Mas o sou por um poder divino, pois para isso nasci do Pai, de uma natividade eterna, como Deus de Deus, bem como Rei de Rei”.6
Portanto, o verdadeiro alcance da sua declaração é este: “Meu Reino não é como os governos deste mundo, nem de acordo com as máximas dele”. Mais ainda: como Autor da graça e, de maneira especial, pela Redenção que irá operar, Jesus é o Rei dos corações. Ele veio oferecer aos homens a filiação sobrenatural, a qual não consistirá numa adoção segundo o conceito humano, mas na participação real em sua natureza divina, como dirá mais tarde o Apóstolo São João: “Considerai com que amor nos amou o Pai, para que sejamos chamados filhos de Deus. E nós o somos de fato” (I Jo 3, 1). Sim, filhos de Deus, herdeiros do trono celeste e príncipes de uma casa eterna!
Algo entendeu Pilatos do significado da resposta de Jesus. Inseguro e assustado, talvez tenha recebido uma graça dada pelo próprio Salvador. Então manifestou a inquietação que o invadia diante daquele majestoso e incomparável Acusado, que Se proclamava Rei da eternidade.
37 Pilatos disse a Jesus: “Então, Tu és Rei?”
Mais uma vez Jesus não negará a sua realeza, e sobre ela fará a última e mais sublime das afirmações: o Unigênito do Pai não veio governar pela força, mas pela onipotência da verdade. Ele trazia a explicação e o sentido de toda a ordem da criação, iniciando assim o “Reino da verdade e da vida, Reino da santidade e da graça”.7
37Jesus respondeu: “Tu o dizes: Eu sou Rei. Eu nasci e vim ao mundo para isto: para dar testemunho da verdade. Todo aquele que é da verdade escuta a minha voz”.
E ao encerrar o diálogo ― registrado em cada um dos seus pormenores pelo Discípulo Amado ―, como extremo convite “tencionava persuadir Pilatos a unir-se àqueles que eram receptivos aos seus ensinamentos”.8 Como se lhe perguntasse: “E tu, Pilatos, ouvirás a minha voz?”. O governador romano, todavia, não quis atender àquele chamado e condenou o Justo, movido pelo apego a seu cargo. Ouçamos nós a voz da Verdade e adoremos o Divino Rei que hoje nos incita, através da Liturgia, a meditar sobre os fundamentos da sua realeza.
IV – O tríplice fundamento da realeza de Jesus
Rei por natureza divina
Deus é Rei e Se vestiu de majestade, revestiu-Se de poder e de esplendor! Vós firmastes o universo inabalável, Vós firmastes vosso trono desde a origem, desde sempre, ó Senhor, Vós existis!” (Sl 92, 1-2), canta o Salmo Responsorial desta Solenidade de Cristo Rei. Com efeito, enquanto Filho Unigênito do Pai e Segunda Pessoa da Santíssima Trindade, Ele existiu desde toda a eternidade e criou o universo como seu Reino, sobre o qual tem o direito de governar, sendo o Senhor absoluto dos Anjos e dos homens, e o Dominador dos infernos, entre outros títulos. Por conseguinte, a primeira razão do poder régio de Jesus é a sua natureza divina. Antes de tudo Ele é Rei por ser Deus.
Entretanto, não é atribuída a realeza às outras duas Pessoas da Trindade, nem há na Liturgia Católica uma festa para cultuar o Pai ou o Espírito Santo como Reis, embora Eles tenham estado associados ao Filho em toda a obra da criação. Por quê?
Rei enquanto Homem
Para alguém ser rei ― no estrito sentido do termo ― é indispensável ter a mesma natureza dos súditos. Ora, entre as Pessoas Divinas esta característica só se encontra no Filho, uma vez que foi o único a Se encarnar, conservando na sua humanidade a plenitude da natureza divina. E a partir de então, além de Criador e Senhor, Ele passou a ser nossa Cabeça.
E qual foi o primeiro trono de sua realeza? Maria Santíssima! No claustro materno e virginal d’Ela o Todo-Poderoso tomou configuração humana, tornou-Se de fato Rei e começou seu reinado.
Mas era necessário que a glória de Nosso Senhor Jesus Cristo, enquanto Filho do Homem, fosse total e, para isso, embora tivesse recebido o título de Rei pela Encarnação, convinha que Ele também o conquistasse através da Redenção.
Rei por direito de conquista
Criados em graça e gozando da amizade de Deus no Paraíso Terrestre, Adão e Eva, no entanto, pecaram, abandonando as maravilhas da participação na natureza divina. Em consequência, os Céus se fecharam e os homens passaram a ser concebidos em pecado, privados da vida sobrenatural. Toda a humanidade, escravizada e condenada à morte espiritual, se encontrava nas malhas de satanás.
Não obstante, desde que o Verbo de Deus resolveu encarnar-Se, o seu Coração Sagrado, divino e humano, cheio de bondade, misericórdia e amor, moveu-Se pelo afeto para com cada um de nós como se fosse um filho único. Derrotando o demônio, Ele reparou a ofensa causada pela transgressão de nossos primeiros pais, libertou-nos da mancha original e abriu-nos as portas da bem-aventurança; reconquistou e devolveu-nos, em alto grau, aquilo que fora perdido no Paraíso, trazendo-nos o extraordinário prêmio dos Sacramentos, sobretudo o Batismo e o perdão dos pecados, bens insuperáveis porque eternos, os quais nos santificam e nos elevam até a sua natureza.
Ademais, em vez de Se encarnar em estado glorioso, Ele assumiu um corpo padecente, a ponto de sofrer necessidades, angústias e penúrias por nós, em toda a sua existência terrena. Tendo o poder de operar a Redenção do gênero humano com um simples ato de vontade ― apenas um sorriso ao nascer, dirigido a sua Mãe Santíssima! ―, quis cumprir a sua missão varando os tormentos inenarráveis da Paixão e entregando a própria vida. Permitiu que fosse descarregado sobre Ele todo o ódio que há contra Deus, aceitou ser condenado num juízo totalmente injusto e deixou-Se levar pelos algozes à morte de Cruz, quando tinha poder para destroçá-los e aniquilá-los num instante. Por fim, com a sua Ressurreição conquistou a nossa e, tendo subido ao Céu, sem cessar oferece o seu sacrifício ao Pai, ao longo da eternidade. Assim, Ele que já era Rei, por natureza divina e por todas as prerrogativas inerentes à Encarnação, adquiriu ainda mais autenticamente o título da realeza como Redentor, por direito de conquista.
A plenitude da realeza
Sim, Nosso Senhor Jesus Cristo é Rei e o seu império se estabelece em duas etapas. Na primeira, a deste mundo, seu campo de realização é a Santa Igreja Católica e seu objetivo a santificação das almas. A jurisdição de Nosso Senhor se exerce no interior dos corações pela graça e, na aparência, deixa agir os homens segundo os seus desejos, uma vez que ainda estão em estado de prova. Legisla pela infalibilidade pontifícia, julga no confessionário e executa seus decretos de forma não manifesta. Contudo, este Reino é invencível, como Ele mesmo afirmou quando prometeu a imortalidade à sua Igreja, dizendo “as portas do inferno não prevalecerão contra ela” (Mt 16, 18), e como já prenunciava também a profecia de Daniel: “Seu poder é um poder eterno que não Lhe será tirado, e seu Reino, um Reino que não se dissolverá” (7, 14b).
Além de não ser destruída ― apesar de todas as tentativas dos seus inimigos ―, a Santa Igreja irá produzindo incontáveis frutos ao longo dos séculos, sempre superiores uns aos outros; mas os seus últimos e mais belos aspectos reluzirão no fim do mundo, no dia em que o Divino Rei consumar a sua vitória sobre a morte, o pecado e o demônio, e for glorificado como fidelíssimo Filho do Pai.
Iniciar-se-á, então, a outra fase de seu reinado. Por isso, na segunda leitura (Ap 1, 5-8) desta Solenidade, o Livro do Apocalipse nos põe diante de um horizonte feito de grandeza que culmina no Juízo Final: “Jesus Cristo é a testemunha fiel, o primeiro a ressuscitar dentre os mortos, o Soberano dos reis da Terra. A Jesus, que nos ama, que por seu Sangue nos libertou dos nossos pecados […], a Ele a glória e o poder, em eternidade. Amém” (1, 5-6). Todos os povos verão a glória de Nosso Senhor Jesus Cristo enquanto Rei ― agora de modo patente e ostensivo ―, bons e maus, os que vão para o Céu e os condenados ao inferno.
“Olhai! Ele vem com as nuvens, e todos os olhos O verão, também aqueles que O traspassaram. Todas as tribos da Terra baterão no peito por causa d’Ele. Sim. Amém!” (Ap 1, 7). Restaurada a criação na sua ordem perfeita, Ele a devolverá ao Pai e dirá: “Aqui está o poder que Eu conquistei. Entrego novamente o universo em vossas mãos”. E, nesse momento, o nosso Rei terá recebido a plenitude da realeza por direito de conquista.
V – Somos da linhagem do Rei
A Solenidade de Cristo Rei, convidando-nos a voltar a atenção e o coração para estes panoramas grandiosos, pede a compenetração de especiais responsabilidades em nossa vida.
Uma vez que participamos da natureza divina e nos tornamos filhos de Deus pelo Batismo, dentre outros privilégios cabe-nos inclusive a sua realeza, pois, além de sermos cortesãos de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei dos reis, pertencemos à sua família como verdadeiros irmãos d’Ele, elevados à categoria de príncipes. Ele quer fazer-nos consortes da felicidade que possui desde todo o sempre como Filho Unigênito, gozando do convívio e da familiaridade com o Pai e o Espírito Santo, e nos há de associar também à manifestação da sua magnificência, quando vier no fim dos tempos. Esta é a nossa nobreza.
Portanto, se nos alegramos por ser da mesma linhagem e da família real de Nosso Senhor Jesus Cristo, templos da Santíssima Trindade, somos obrigados a levar esta filiação até as suas últimas consequências em nossa existência diária.
Senhor, sou vosso!
O que pedimos na Oração do Dia, na Missa da Solenidade de Cristo Rei? “Deus eterno e todo-poderoso, que dispusestes restaurar todas as coisas no vosso amado Filho, Rei do Universo, fazei que todas as criaturas, libertas da escravidão e servindo à vossa majestade, Vos glorifiquem eternamente”.9 Que as criaturas O glorifiquem na sua grandeza régia! Ora, para glorificar o seu soberano, um súdito deve, antes de tudo, ser fiel às suas leis e recomendações.
As Leis de meu Rei se encontram nos Dez Mandamentos, no Evangelho e também no meu interior, pelo senso moral que recebi desde a infância. Em relação a elas preciso ser inteiramente reto, perseverar na graça de Deus, procurando praticar a virtude ao máximo, com aspiração cada vez mais acentuada pela perfeição e pela santidade, pois nada ofende mais este Rei do que o pecado. Se, pelo contrário, eu escolher as vias do vício e deformar minha própria consciência para viver no indiferentismo, renuncio à participação na realeza d’Ele e seguirei outros reis: o demônio, o mundo e a carne.
Nesta magnífica Solenidade da realeza de Nosso Senhor Jesus Cristo, tendo a alma pervadida por tantas maravilhas, bênçãos e graças, desejo voltar-me para Ele e dizer: “Senhor, sou vosso! Sou vossa! Apesar de minhas debilidades e fraquezas, reinai em meu coração, em meus pensamentos e sentimentos. Reinai em minha alma através de Maria Santíssima, o trono que escolhestes para nascer, Rainha por ser Mãe vossa, e também minha Mãe”. ◊